Resumo: Artigo 35709
Novas perspectivas em desenvolvimento de medicamentos em países em desenvolvimento: um estudo de caso do composto brasileiro P-MAPA (4, 5, 100, 102, 115, 116)
Carlos Fioravanti, Lea Velho, Universidade Estadual de Campinas, Brazil.
Apresentação: Wednesday, May 29, 2008 3:45PM - 5:45PM sala 210 - UNIRIO VII ESOCITE - Sessão 17 - Chair: Pablo Kreimer
Abstract.
Mesmo em países industrializados, desenvolver medicamentos é um desafio que exige investimentos elevados e recursos humanos altamente qualificados. Devido a essas limitações, os pesquisadores de países em desenvolvimento como o Brasil dificilmente vão além da descoberta de moléculas de interesse farmacológico; apenas produtos farmacêuticos naturais, derivados de recursos vegetais ou animais e resultantes do conhecimento popular, avançam localmente. Países em desenvolvimento quase sempre consomem apenas medicamentos criados em países desenvolvidos, em um cenário de atores e não-atores que tem sido a norma há décadas. Mesmo assim, um pequeno grupo de cientistas desenvolveu o primeiro candidato a medicamento no Brasil que cumpriu as normas internacionais de pesquisa e desenvolvimento de fármacos desde a seleção inicial de microrganismos até os testes clínicos fase I. Seu nome químico é agregado polimérico de fosfolinoleato-palmitoleato de magnésio e amônio protéicoou P-MAPA. Não é um produto natural, mas um composto químico obtido por fermentação fúngica por meio de processos biotecnológicos. Este é o primeiro caso de desenvolvimento coletivo e multidisciplinar de um candidato a fármaco no Brasil e também o primeiro de pesquisa translacional (translacional research) na área farmacêutica no Brasil. É ainda um caso singular de produção, apropriação e transferência de conhecimento, já que a organização não-governamental e sem fins lucrativos que coordena a pesquisa prioriza o desenvolvimento de medicamentos para doenças e populações negligenciadas. Quando e se o P-MAPA for aprovado pelas autoridades regulatórias, o grupo de pesquisa pretende oferecer os dados de pesquisa e licenciar a tecnologia de produção, sem custos, para instituições, indivíduos e grupos interessados em ampliar o acesso de populações socialmente excluídas a medicamentos. Embora esse composto tenha de passar por estudos clínicos mais amplos até ser aprovado pelas autoridades regulatórias e poder ser vendido, seu potencial é enorme: como já demonstrado em experimentos feitos em modelos animais e em estudos clínicos preliminares, pode ajudar a deter doenças infecciosas como malária, Aids e tuberculose, além de câncer. Tamanha versatilidade se explica por sua capacidade de induzir a produção de moléculas-chave do sistema imune chamadas interferom-gama, que estimula a produção de anticorpos e células de defesa, como confirmado este ano em testes feitos nos Institutos Nacionais de Saúde (NIH) dos Estados Unidos. Mas como um grupo pequeno de pesquisadores, sem experiência e sem qualquer apoio do governo e de empresas farmacêuticas, em um país sem tradição de pesquisa ou produção de medicamentos originais, conseguiu chegar tão longe? Este trabalho mostra, com base na Teoria da Rede de Atores, que o grupo que coordena essa pesquisa formou redes abertas e híbridas, reunindo talentos dispersos em torno de um objetivo ambicioso e socialmente relevante. Essa estratégia apresenta movimentos bottom-top em vez do habitual enfoque top-down; é bastante rara também porque as experiências mais recentes de pesquisa coletiva no Brasil, ainda que multiinstituticionais, reuniram apenas especialistas ligados à pesquisa básica, sem terem gerado aplicações. Normalmente, por falta de articulação entre os atores sociais, a pesquisa básica termina com a publicação de papers em revistas especializadas e as substâncias de interesse farmacológico descobertas em países em desenvolvimento acabam sendo exploradas em outros países.